Cinema
sexta-feira, 23 de dezembro de 2011 | Published in | 1 comentários
Uma Crônica de Segunda #7
segunda-feira, 19 de dezembro de 2011 | Published in | 0 comentários
Alergia ao Século XXI
sexta-feira, 9 de dezembro de 2011 | Published in | 1 comentários
E o tempo passou, no mundo sem aquele homem as pessoas mudaram, e depois de muito tempo perdido em brigas e discussões, em preocupações que em nada levavam, em valores falsos que não ajudavam a ninguém, elas perceberam que também faltava algo nelas, uma sensação de vazio que nunca ia embora, um frio no estomago que não sumia. Grandes cientistas pesquisaram o estranho fenômeno e nada descobriram, mas alguém se lembrou do velho homem que tinha esses mesmos problemas e que há muito tempo havia abandonado a sociedade. Todas as pessoas do mundo se juntaram e foram atrás daquele homem, e todos ficaram espantados ao verem que ele ainda estava vivo depois de tantos anos. Eles pararam e falaram para aquele homem tudo que sentiam e o homem olhava para eles como se olha para alguém que tem o mesmo problema que você e que por isso te entende. O homem contou para todo mundo como ele se sentia na sociedade e como os problemas dele acabaram quando ele foi viver nas montanhas. As pessoas ouviram e voltaram para suas casas e começaram a deixar de lado os falsos valores que defendiam e começaram a olhar nos olhos umas das outras sem mais desconfiar, valorizando mais o ser do que o ter ou parecer. Graças a isso o mundo havia mudado mais ainda, e a hipocrisia havia sido varrida da face da Terra, assim como o egoísmo e a destruição, o amor passou a ser cada vez mais celebrado e o ser humano não mais tinha preconceitos. Tudo isso por causa do homem que tinha alergia ao século XXI, por tudo isso as pessoas do mundo o chamaram para sair de sua montanha e ver o que ele havia feito, e o homem aceitou. Desceu de sua montanha e viu a sociedade que havia surgido, ficou espantado e feliz, pela primeira vez ele não se sentia incomodado no meio das pessoas, parecia que sua alergia havia acabado, era o primeiro dia do século XXII.
Uma Crônica de Segunda #6
segunda-feira, 5 de dezembro de 2011 | Published in | 0 comentários
Só Isso?
sexta-feira, 2 de dezembro de 2011 | Published in | 0 comentários
Uma Crônica de Segunda #5
segunda-feira, 28 de novembro de 2011 | Published in | 1 comentários
Resistência
sexta-feira, 25 de novembro de 2011 | Published in | 0 comentários
Uma Crônica de Segunda #4
segunda-feira, 21 de novembro de 2011 | Published in | 0 comentários
- A menos que o nome da banda seja “Fulano e os Alguma Coisa” eu não ouço bandas cujo nome tenha mais de 4 palavras. Não sei de onde algumas pessoas acham que nome de banda tem que ser um período composto.
- Eu também não ouço nada que precise de mais de duas palavras para ser descrito. “Punk Rock” = bom, “Heavy Metal” = bom, Hardcore = bom; “Neo Metal Progressivo Gótico Melódico” = nem pensar e suma com essa coisa da minha frente.
- A menos que estejamos falando dos Titãs no início de carreira, eu também não vou ouvir qualquer banda que tenha mais de 5 integrantes. Qualquer coisa acima disso é palhaçada.
- No caso de bandas brasileiras, eu gosto de ver entrevistas com membros da banda. Se algum deles falar qualquer coisa “brasilianidade” como forma de descrever algo do estilo musical deles, eu também não vou perder o meu tempo ouvindo.
- E por último, eu não ouço nada que pareça feliz demais. A felicidade em excesso me soa falsa, tudo que é muito “felizinho”, muito “bonitinho” serve apenas para me irritar.
Bem Vindos ao Mundo Moderno
sexta-feira, 18 de novembro de 2011 | Published in | 0 comentários
Uma Crônica de Segunda #3
segunda-feira, 14 de novembro de 2011 | Published in | 1 comentários
Trocas
sexta-feira, 11 de novembro de 2011 | Published in | 0 comentários
Uma Crônica de Segunda #2
segunda-feira, 7 de novembro de 2011 | Published in | 0 comentários
Fútil
sexta-feira, 4 de novembro de 2011 | Published in | 0 comentários
Uma Crônica de Segunda
segunda-feira, 31 de outubro de 2011 | Published in | 0 comentários
A Vida Triste
sexta-feira, 16 de setembro de 2011 | Published in | 0 comentários
A vida não tinha sido das mais fáceis para João. Nasceu numa cidade do interior do Ceará, mudou-se para São Paulo quando criança, pois o pai buscava um emprego melhor do que a lida na roça. Trabalhou de pedreiro a vida inteira, acordando cedo, chegando em casa cansado e sem muita perspectiva de melhora. Nunca se casou, apesar de já ter tido algumas mulheres, também nunca teve filhos, pelo menos não filhos que sabia existirem. Agora aos 68 anos estava velho, cansado e completamente sozinho. Vivia triste e solitário, amargurado, seu único contato com outros seres humanos costumava ser em filas de hospitais e brigando com as crianças da rua que insistiam em jogar futebol justamente em frente sua casa. Ele era um velho solitário e rabugento, que vivia dizendo que a vida havia sido dura demais com ele. Esse tipo de vida que levava acabou por ser um problema, afinal, quando João morreu, sozinho em sua cama durante o sono, só descobriram o corpo quase uma semana depois, apenas por conta do mal cheiro. Enfim, aquela não tinha sido uma vida fácil.
Em outro lugar em outro plano de existência, algumas criaturas, cuja forma nossas mentes humanas são incapazes de imaginar, conversavam animadamente entre si:
- E aí? Como foi essa sua última vida?
- Ah, eu achei divertido, nunca tinha vivido uma vida triste. Foi a primeira vez que vivi uma vida desse jeito...
- Tá, mas conta mais.
- Bem, eu fui um cara chamado João. Solitário, sem filhos nem esposa que passou um monte de problemas na vida. Um sujeito bem besta na minha opinião. Ele sofreu muito e tal. Foi legal ser ele, porque foi diferente, mesmo quando encontrava uma vaga em vidas ruins sempre tinha alguma coisa que era divertida. Essa foi ruim do início ao fim, hehe.
- Sério? Achei que você tinha dito que gostou.
- Mas eu gostei. Foi como disse, foi divertido fazer algo diferente. Mas e você? Como foi a sua última?
- Ahh, eu acabei sendo um empresário bem sucedido, até bem feliz. Não gostei muito não. Te recomendei essa vida triste porque eu gosta mais dessas. Tipo, já vivi muitas vidas felizes, hoje em dia só essas tristes me dão emoção de verdade. Pra falar a verdade essa minha última vida foi bem sem graça...
- Não sei como você pode dizer isso. O drama todo que eu vivi foi legal e tal, mas nem é tão divertido assim. Acho que nunca vou entender essa sua fixação pela tristeza, hehe.
- Não é fixação pela tristeza. Na verdade é só porque ela costuma ser mais interessante de ser vivida. Esse povo que escolhe vidas felizes e tal, acaba que no final é tudo muito parecido. Apenas vivendo as vidas tristes é que conseguimos algum tipo de emoção de verdade.
- Ahh, fale por você. Eu gosto de umas vidas mais alegres. Gostei da experiência, tem seu charme e tal. Mas as vidas felizes parecem que passam mais rápido e você me conhece, eu adoro ficar mudando de vidas. Muito tempo em uma vida só me enjoa.
- Já eu acho que todos são muito curtas. Acho que você ta falando besteira. As tristes são mais divertidas, tem mais opções. A felicidade é sempre uma só, enquanto a dor e o sofrimento ocorrem de várias formas.
- Creio que nós não vamos conseguir convencer um ao outro né?
- Pelo visto, acho que sim. Vamos deixar essa conversa de lado. Acabou de sair a lista das novas vidas que vamos poder escolher, tô de olho em uma que parece que vai ser divertida: um cara que ao final da vida morre abandonado pelos filhos, não li o resumo completo, mas só esse pedaço já me chamou a atenção.
- Você e essas suas vidas tristes, hehe. Eu ainda não sei o que escolher, vou dar uma olhada na lista, mas com certeza, não tenho os mesmos gostos que você.
- É uma pena, mesmo porque você sabe que eu sou maioria. A maioria de nós acha mais divertido as vidas tristes, por isso essas sempre tem de sobra pra escolher.
Na saúde e na doença
sexta-feira, 3 de junho de 2011 | Published in | 1 comentários
O dia amanheceu e ele pode sentir os primeiros raios da manhã entrando pelo quarto. Não importava se era dia da semana, feriado ou domingo, ele sempre acordava na mesma hora, anos acordando sempre cedo acostumaram o seu corpo a isso. Olhou pro lado e viu a esposa deitada, ainda dormindo e roncando baixinho. Ainda a amava tanto quanto na primeira vez que a olhou dormir ao seu lado e sabia que eram um caso cada vez mais raro nesse mundo.
Já estavam juntos a mais de cinqüenta anos. Ele era Arnaldo José, o “seu Arnaldo”, ela era “dona Maria” sua esposa, e juntos tinha sete filhos, mais de trinta netos e já contavam com alguns bisnetos. Muitos anos juntos, muitos momentos compartilhados, e no saldo geral mais bons momentos do que ruins.
Seu Arnaldo se levantou com as dores no corpo que a velhice traz. Ainda estava bem forte para a idade que tinha, e achava que isso se devia as caminhadas logo pela manhã, aos livros que costumava ler e as palavras cruzadas, paixão que tinha vindo com a aposentadoria.
Trocou de roupa e saiu para sua caminhada matinal. Ao retornar, abriu a porta e sentiu o cheiro de café penetrando suas narinas. Dona Maria já tinha se levantado e estava com um roupão velho e puído, mas que ela adorava, e mesmo com os sinais da idade marcados no rosto, seu Arnaldo ainda achava sua esposa linda. Lhe deu um beijo e passou a ler o jornal em cima da mesa da cozinha. Moravam os dois sozinhos naquela casa simples mais confortável que ele tinha construído. Os filhos cresceram e foram embora criar sua própria família, mas sempre voltavam para aquela casa, trazendo os netos nos fins de semana.
Os netos... Bem, tinha-os de todas as idades. Alguns não moravam mais na mesma cidade que eles, outros ainda passavam lá depois da escola, e outros ainda nem tinha idade para saber direito o que acontecia ao redor. Ele e a esposa amavam a todos, vivam em função dos netos e até mesmo aprenderam a usar um computador para estar sempre em contato com os mais distantes... E justamente por conta desse amor não só aos netos como também a toda a grande família que a tragédia daqueles dias tornou tudo mais difícil.
Era um dia calmo, no meio da semana e no meio da manhã, seu Arnaldo estava deitado no sofá da sala fazendo algumas palavras cruzadas quando o telefone tocou. Era um de seus filhos, um que morava em outra cidade ligando. Estava ofegante, desesperado e com voz chorosa e perguntava se os dois idosos estavam bem. Seu Arnaldo respondeu que sim, deu um estranho olhar para dona Maria que tricotava ao seu lado, e perguntou o porquê de todo aquele desespero. Seu filho se limitava a pedir para ligarem a televisão.
Um noticiário, desses plantões urgentes, estava passando. Uma repórter, no centro da cidade onde viviam, informava que algum tipo de doença tinha atingido algumas pessoas. Ao fundo via-se dezenas de pessoas correndo desesperadas, cada uma numa direção, e ao fundo algumas outras pessoas pálidas, mancando, vinha em direção das outras. Aquela cena não fazia sentido algum, e a repórter falava coisas completamente sem sentido, como “mortos vivos”, “zumbis” e sabe-se lá o que mais. Para seu Arnaldo era algo completamente absurdo, e a única coisa que ele pensava é que deveria ser uma doença ou coisa assim. Falou com o filho que não tinha com que se preocupar, que a casa deles era longe do centro, que eles estavam bem e que a policia não ia deixar nada acontecer. O filho se acalmou, se despediram e desligaram o telefone.
Seu Arnaldo ficou pensando no que vira. Era uma doença estranha a daquelas pessoas e não conseguia entender porque corriam dos infectados. Tentou assistir um pouco mais daquela notícia, mas chegou a conclusão de que não fazia sentido e que o desespero era exagerado. Desligou a TV, terminou as palavras cruzadas e depois foi ajudar a esposa com o almoço, afinal alguns dos netos iriam para lá logo após saírem do colégio que ficava não muito longe.
Foi uma tarde normal, apesar das notícias vistas de manhã. Brincou com os netos durante a tarde e no começo da noite dois de seus filhos estiveram lá para buscar as crianças. Recebeu ligações de familiares durante toda a tarde, perguntando se estavam bem, respondeu que sim, que as coisas do noticiário eram num local longe, e que a policia já devia estar cuidando daquilo. Tudo parecia bem.
De noite, ligou a televisão novamente, a mesma notícia nos jornais. Mas as pessoas pareciam agora mais preocupadas. O centro da cidade era um caos, com carros virados e pegando fogo. A repórter falava sobre o caso, mas ao fundo os tiros chamavam mais atenção, ouviam-se muitos e a polícia parecia ter problemas para controlar a multidão que corria, bem como as pessoas infectadas com aquela estranha doença. Avisos foram dados para que ninguém saísse de casa e seu Arnaldo começou a ficar preocupado. Ligou para os filhos para ver se estavam bem, trancou as portas de casa, deu um beijo na esposa e ambos foram dormir.
Foi uma noite estranha. Não se ouviam muitos barulhos naquela região da cidade, mas algo parecia estar errado e o sono vinha difícil, agitado, isso quando vinha. Na manhã seguinte seu Arnaldo se levantou com os primeiros raios de sol da manhã, ainda estava preocupado e foi ligar a televisão.
Ainda se falava daquela estranha doença. Uma outra repórter dizia que a praga havia se alastrado e que a policia não conseguia impedir a confusão, e nesse momento seu Arnaldo achou melhor não sair de casa para caminhar. Ficou vendo o jornal, preocupado com sua família, tentou usar o telefone para ligar para os filhos, mas estavam mudos... Pegou o celular, ligou para um dos filhos, era estranho, mas o celular funcionou. Falou com os filhos que moravam naquela mesma cidade, estavam todos com medo, trancados em suas casas, e conversando decidiram que o melhor era esperar. A essa altura o exército já deveria estar fazendo alguma coisa.
Seu Arnaldo deixou portas e janelas trancadas e foi continuar a ver o noticiário. Sua esposa já havia levantado e via as notícias junto com ele. Conversavam e dividiam a preocupação com o restante da família. Ainda com medo e, a essa altura já sem muita vontade de conversar, almoçaram e dessa vez sem esperar a chegada dos netos, pois sabiam que estes estavam com os pais, trancados em suas casas esperando essa onda de terror passar. Tentou ligar novamente para os filhos, mas agora os celulares estavam mudos... Não sabia o que tinha acontecido e a preocupação só aumentava...
Pensou em sair e ir até a casa de um dos filhos que morava nas proximidades, mas enquanto tentava superar o medo e se preparar para sair começou a ver pela janela sinais de fumaça, negras, erguendo-se no horizonte e barulhos do lugar onde vinha a fumaça. Parecia que a confusão e aquela doença tinham chegado até eles. O medo tomou conta e o casal achou melhor não sair e esperar as coisas se resolverem. Se abraçaram e ficaram vendo as notícias na televisão...
O barulho apenas se aproximava deles, cada vez mais alto, mais forte, com mais gritos de dor e medo. Os dois idosos choraram abraçados, vendo as notícias. Eram mais estranhas ainda, a doença contaminava outras pessoas por meio de mordidas e arranhões, e os novos contaminados passavam a ficar também com a pele pálida, lábios escuros e olhos amarelados e sem vida, e depois disso passavam a ir atrás de novas pessoas que ainda não tinha a doença. Falava-se muito de como a doença agia e que deveriam correr de quem a tivesse, mas não falavam de onde essa doença tinha vindo. E no meio de uma dessas explicações, a televisão subitamente saiu do ar. Chuviscos preenchiam a tela e antes mesmo que pudessem trocar de canal, a luz da casa acabou.
Ficaram os dois ali abraçados, em silêncio, ouvindo o som de pessoas correndo na rua e gritando, e ambos tinham medo até de olhar pela janela. Pensavam nos filhos, nos netos, nos bisnetos e até em parentes distantes que não viam a anos.
Nessa hora ouviram o som de algo ou alguém batendo na janela. Olharam para o local e viram uma das pessoas infectadas, com todas as características que a televisão disse que tinham. Essa pessoa tentava entrar, e seu Arnaldo, mesmo com muito medo, se levantou, pediu para a esposa fica de olho e foi até os fundos casa. Ia procurar alguma coisa pra defender sua mulher caso aquela pessoa entrasse, ele estava velho, mas ainda era um homem que sabia defender sua família. Não tinham armas de fogo em casa e a melhor coisa que seu Arnaldo encontrou foi uma grande chave inglesa dentro de sua caixa de ferramentas.
Pegou a ferramenta, e medindo o peso, achou que seria o bastante para afastar alguém que lhes tentasse fazer algum mal. Nessa hora ouviu o som de vidro se quebrando e o grito de sua esposa. Correu para a sala onde estavam e viu a pessoa infectada mordendo o braço de dona Maria. Sem pensar duas vezes, seu Arnaldo bateu forte na cabeça daquela pessoa, mais monstro que humano, acertou a chave inglesa uma, duas, várias vezes, até aquilo cair no chão e parar de se mexer. O sangue escuro, quase negro, escorria pelo chão junto com pedaços do cérebro de um homem... Seu Arnaldo passou a tremer, nunca tinha matado uma pessoa, e mesmo tremendo pediu para sua esposa ter calma, pegou um kit de primeiros socorros e fez um curativo no braço machucado de dona Maria.
Depois de estancar o sangramento, choraram abraçados após se trancarem num depósito, um quarto sem uso e sem janelas onde guardavam algumas coisas velhas. Depois de um tempo, seu Arnaldo sentiu a pele da esposa ficando cada vez mais fria, ela tremia, e ele tentou confortá-la, e pouco tempo depois, dona Maria olhou para ele com aqueles olhos amarelados e sem vida e tentou mordê-lo. Seu Arnaldo se afastou rapidamente, aquela não parecia mais ser sua esposa, ela tinha sido infectada por aquela estranha doença.
Ela voltou a atacá-lo, ele a empurrou para longe. Ela se levantou e tentou atacá-lo de novo, e ele, mais por medo do que por qualquer outro motivo, agarrou a chave inglesa e acertou com força na cabeça da esposa. Destrancou a porta, saiu, trancou sua esposa dentro e foi tentar conseguir ajuda. Ter feito aquilo o abalou bastante, em mais de 50 anos nunca tinha seque ameaçado bater em dona Maria, e justamente naquele momento de desespero havia feito aquilo. Resolveu sair para a rua e ver se conseguiria alguma ajuda.
Na rua, parecia que o caos havia tomado conta. Poucas pessoas haviam, e essas corriam desesperadamente. As pessoas que tinham sido infectadas estavam parecendo animais, devorando algo que a muito parecia ser um dos vizinhos da rua. Seu Arnaldo sentiu nojo e quase vomitou, voltou em desespero para dentro de sua casa. Tentou os telefones, todos mudos. Não havia energia elétrica, num antigo rádio a pilha que encontrou, somente conseguia ouvir estática. Parecia que o mundo estava acabando, era o Apocalipse bíblico chegando até eles. Pensou nos filhos, nos netos, na esposa trancada e começou a chorar. Um turbilhão de emoções tomou conta dele e chegou a conclusão de que jamais veria sua família de novo. O fim dos tempos finalmente havia chegado e não havia nada do que ele pudesse fazer.
Nessa hora e com tais pensamentos em mente, seu Arnaldo tirou a camisa que usava. Nesta hora percebeu que era uma camisa azul, de manga curta e de botões, havia ganhado a mesma no seu aniversário do ano anterior, e havia sido justamente presente de sua esposa. Chorou mais ainda ao se lembrar disso. Pensou nos bons anos de casamento que tivera, nos bons momentos com a família, no sorriso dos netos...
Foi em direção ao quarto no qual a esposa estava trancada. Abriu a porta e o monstro que estava lá dentro olhou para ele e foi em sua direção. Deixou ser atacado e enquanto sentia os dentes de sua esposa entrando em seu pescoço, conseguiu repetir apenas para si mesmo: “na saúde e na doença”.
Amor e Cigarros
sexta-feira, 29 de abril de 2011 | Published in | 0 comentários
Aquele provavelmente era o boteco mais sujo e feio que ele já tinha entrado. Era impressionante: sujo do chão ao teto, paredes mofadas e descascando tanto quanto as velhas mesas de metal espalhadas pelo local, homens gordos e sem camisa tomavam cervejas baratas e falavam alto vendo um jogo de futebol numa televisão velha. Fabiano tinha entrada apenas para comprar uma carteira de cigarros. Um cigarro dos mais fortes para lidar com aquilo que ele sentia.
Tinha andado a esmo por um tempo, dirigindo sem rumo e remoendo antigos pensamentos. No meio desses pensamentos surgiu uma súbita e inesperada vontade de fumar, algo que ele não fazia já tinham 5 anos. Era estranho, porque o motivo pelo qual ele viria a voltar a fumar era exatamente o mesmo motivo pelo qual ele havia parado de fumar...
Quando adolescente, aconteceu a Fabiano o que acontece com qualquer adolescente fã de rock. É difícil não fumar num ambiente onde os seus maiores ídolos são fumantes inveterados e que qualquer ambiente de show possui um ar viciado em cigarros. O tempo passou e o vício foi ficando e se instalando, ao ponto de que a companhia do cigarro estava sempre presente. Amigos e mulheres iam e vinham, mas os cigarros sempre estavam lá com ele, isso é, até ela entrar na vida dele...
Ela era Natália, uma namorada que foi entrando na vida de Fabiano tão sorrateiramente quanto o cigarro havia entrado e que causava tantos problemas quanto este. Namoraram por 5 anos, e ela, por ser asmática, não podia com cheiro de cigarro. As vezes ela passava mal se Fabiano chegasse perto dela com aquele cheiro mais do que característico.
Desse jeito foi difícil o começo do namoro. Fabiano sempre com os cigarros ao seu lado e Natália passando mal até mesmo com a menção da palavra “cigarro”. Acabou que Fabiano, por ser início de namoro, passou só a fumar quando sabia que não iria encontrar com ela. Mas com o tempo, e com eles se vendo cada vez mais, gradualmente Fabiano foi deixando o cigarro de lado até ter totalmente parado. E exatamente no dia em que Fabiano e Natália tinham terminado, ao sair da casa dela, e andando a esmo ainda absorvendo o fim do namoro, ele sentiu a já mencionada súbita vontade de fumar. E foi assim que a relação de Fabiano com o cigarro, que já havia esfriado a anos retornou com força total.
As primeiras tragadas foram diferentes do esperado. Uma sensação da garganta sendo arranhada, a fumaça voltando a entrar nos pulmões, uma tosse que insistia em denunciar que havia tempo que ele não fumava... tudo isso não conseguiu impedir a volta da vontade, e em pouco tempo, a carteira de cigarros voltou a ser a companheira inseparável, quase como um amigo que a muito não se vê mas que quando se encontra com ele de novo parece que a amizade nunca acabou.
E assim continuou a vida de Fabiano e seus cigarros.
O tempo passou, e, como dizem, o tempo é capaz de curar todas as feridas. Contudo, ainda existia dentro de Fabiano uma ferida que parecia estar mal curada, uma ferida que possuía nome: Natália. Pensava muito pouco nela, mas nas poucas vezes que pensava, um sentimento forte, misto de agonia, dor e saudade, ainda lhe brotava no peito. O rosto dela de vez em quando aparecia em meio a fumaça do cigarro expelida por Fabiano.
E foi justamente num dia desses, de saudade repentina e inexplicável, que Fabiano encontrou com Natália. Coincidência, estavam ambos no mesmo bar, cada um com seu respectivo grupo de amigos.Em situações como essa ninguém nunca sabe o que fazer, mas podemos dizer que ambos sentiram a mesma coisa: um susto, seguido por um súbito calafrio, um suor repentino e por fim uma sensação de desconforto enorme. Como não havia outra forma de agir e ambos sabiam que ambos haviam se visto, sobrou apenas a opção de se cumprimentarem. Se cumprimentaram como manda o protocolo, trocaram sorrisos e uma conversa de breves amenidades e, não se sabe por iniciativa de alguém, acabou que ambos continuaram conversando, até que estavam a sós numa das mesas desse bar. O protesto de cada um dos grupos de amigos foi feito, mas por motivos inexplicáveis, tais protestos foram solenemente ignorados.
Natália se sentia bem conversando com Fabiano, somente uma coisa lhe chamava atenção: o maço de cigarros que estava sobre a mesa, ao lado do telefone celular de Fabiano. Ela não conseguia entender, afinal de contas, por várias vezes ela ouvira ele dizer que havia parado de fumar, pelo menos durante o namoro dos dois. Fabiano não conseguiu não perceber o olhar de Natália sobre o já habitual maço de cigarros e nessa hora ele percebeu que ela não sabia da volta de sua “antiga paixão” e assim antigas feridas de Fabiano se abriram de vez. Nessa hora ele pegou o maço de cigarros, olhou para eles, depois olhou no fundo dos olhos de Natália e assim soltou um longo monólogo:
- sabe Natália, eu havia parado de fumar por sua causa. Mas no dia em que terminamos, a primeira coisa que fiz foi comprar um novo maço de cigarros. Ao acender o primeiro, tinha uma sensação estranha... me fez mal, mas aos poucos eu sentia que a medida que soltava a fumaça era como se parte do que sentia por você fosse embora. Você sabia que eu tinha parado de fumar unicamente por sua causa, e durante todo nosso tempo juntos eu não senti mais falta nenhuma de cigarros. Mas foi só terminarmos que a vontade voltou com força total. Desde então voltei a fumar, e o cigarro está comigo sempre. Ele é meu companheiro e a única coisa que as vezes aplaca a dor que eu sinto no meu peito quando penso em você. Ainda sinto um pouco de raiva, de medo, de frustração, mas fumar afasta você da minha mente, afinal era uma das coisas que você mais odiava em mim.
Natália ouviu esse longo discurso, e fitou os olhos de Fabiano. Cabe aqui mencionar uma detalhe, a visão de Fabiano e Natália olhando um para o outro era um pouco desconcertante, afinal Fabiano tinha quase dois metros de altura, pele morena e cabelo sempre raspado, enquanto Natália tinha oficiais um metro e sessenta (sua verdadeira altura era inferior a isso, mas era um mistério nunca desvendado) cabelos castanhos claros e pele branca. Eles pareciam perfeitos opostos quando se encaravam.
Mas voltando a história. Como disse, Natália ouviu atenta o discurso de Fabiano e sua reação foi a mais inesperada possível. Ela se levantou, encaminhou-se em direção ao balcão do bar, sempre sob os olhares atentos de Fabiano. Ela voltou para a mesa, desembrulhou uma embalagem de chiclete, o qual tinha ido buscar no balcão, e colocou na boca de Fabiano e mandou-o mastigar. Ele obedeceu, em pouco tempo ela, com um guardanapo nas mãos, mandou Fabiano cuspir o chiclete fora. Ao cuspir o chiclete, Natália emendou um longo beijo em Fabiano. Fabiano nunca mais fumou novamente.
Infelicidade Compartilhada
domingo, 24 de abril de 2011 | Published in | 1 comentários
Ele estava com sérios problemas. Um relacionamento que ele não gostava, um emprego que ele não queria mais e uma família que lhe acabava com a paciência. O namoro começara e continuara ali, como quem não quer nada, e acabou ficando longo, tedioso, com sentimentos mortos e que somente continuava porque terminar e partir para outra era algo que dava muito trabalho e medo. O trabalho era tedioso, chato, mas pagava as contas e, infelizmente, por este motivo, o obrigava a continuar. E por fim a família, com suas insistentes cobranças de casamento e carreira não lhe davam apoio e somente serviam para aumentar o número de frustrações na qual vivia.
Ela já tinha sido muito bonita, mas o tempo e os problemas ajudaram a levar parte da beleza embora. Já estava formada a alguns anos, mas não conseguia arrumar um emprego. Tudo era sempre ou fora demais de sua área ou algo que ninguém mais queria fazer. Tinha a impressão de que os anos de faculdade haviam sido jogados no lixo e que sua vida seria para sempre uma sucessão de frustrações. Os sonhos da faculdade agora eram estranhas e distantes sombras que agora pareciam inalcançáveis. E comer acabava sendo uma boa forma de escapar dos problemas.
Ele teve a sorte de ser bem nascido. Família tradicional, rica, com bastante influência em diversos órgãos do governo. Toda a sua vida havia sido planejada desde o nascimento: o colégio onde estudou, a faculdade que cursou, o emprego que conseguiu e a rápida promoção que sucedeu. Contudo, ele sabia que quase tudo em sua vida fora escolha de seus pais. Não tinha noção da última vez que havia feito uma escolha por si mesmo, e vivia sem saber se vivia uma vida plena ou se simplesmente vivia por inércia, seguindo aquilo que seus pais indicavam. Havia chegado a uma posição que muitos invejariam, mas nunca teve certeza se era ali que queria estar.
Ela teve um filho jovem, com apenas 16 anos, e por conta disso teve que abrir mão de quase todos os seus planos. Os cursos fora do país, a faculdade em outra cidade, as experiências que teria... tudo tivera que ser jogado por fora por conta de uma gravidez indesejada. Possuía grande apoio de seus pais, mas a gravidez precoce a fez ter que abrir mão de todos os sonhos e se dedicar a outra vida, um filho cujo o pai agora parecia ignorar e a contribuição na criação era uma mísera pensão. O pai de seu filho ainda podia seguir todos os seus sonhos, e ela era obrigada a arcar com o peso da criação do filho.
Ele afogava as mágoas em copos de bebidas e relacionamentos efêmeros. Nada parecia ser permanente, a não ser o trabalho, a única coisa que era estável em sua vida. Tudo lhe era chato, e suas frustrações amorosas o levavam a cada vez mais se concentrar apenas em trabalho e aos poucos ele se afastava das pessoas. Copos de cervejas e mulheres saiam de sua vida, mas o trabalho era constante e cada vez mais saia menos. O trabalho virava sua única válvula de escape.
Os cinco tinham em comum apenas a infelicidade que cercava suas vidas e a amizade que os unia. Os encontros não eram tão freqüentes quanto deveriam nem tão divertidos quanto as lembranças mostravam, mas a amizade que tinham uns com os outros era a única coisa que alivia a infelicidade comum a todos. Juntos eles tinham o único sorriso em muito tempo, a única felicidade em muito tempo e a única real companhia em muito tempo. A amizade entre eles os dava força para continuar, e nas poucas vezes que se viam, os problemas que os cinco possuíam pareciam diminuir em frente a efêmera felicidade que tais encontros causavam.
A infelicidade de todos era compartilhada e assim a pouca felicidade que ainda possuíam e as lembranças desses bons momentos serviam de força para seguirem em frente por mais uma semana.
Cinema
segunda-feira, 4 de abril de 2011 | Published in | 4 comentários
Eu adoro cinema. Não tem jeito, não importa o quanto uma televisão fique grande, a maior TV do mundo nunca irá ser tão legal quanto ver um filme numa sala de cinema. É simples assim, um fato incontestável, a tela grande do cinema é incomparável.
Contudo, esse simples prazer vem se tornando cada vez menos prazeroso. Não que haja alguma coisa errada com o cinema em si, muito pelo contrário, o que atrapalha o cinema hoje em dia é o todo o ritual que agora se tornou obrigatório para se assistir um filme. E esse ritual está tirando toda a graça de ver um filme na tela grande.
Mas que ritual é esse? Você me pergunta, e eu respondo. Mas para isso vamos contar uma pequena história.
Você decidiu sair de casa para ver um filme. Pois bem, os problemas começam antes mesmo de sair de casa, afinal de contas escolher a sessão do filme é parte importante do ritual. Em qualquer filme, se a sessão for antes das 22 horas, você corre o risco de ficar cercado por adolescentes com hormônios em fúria, os quais irão gritar quando verem qualquer cena de beijo, de sexo ou quando um determinado ator e/ou atriz aparecer. Como eu detesto essa gritaria toda, e sei que, por mais bagunça que esses moleques façam o máximo irá acontecer com eles é ter um gerente que gentilmente irá pedir para eles se comportarem, só me resta ter a certeza de que é impossível ver um filme antes das 22 horas sem se irritar. Após as 22 a probabilidade desses problemas ocorrerem é menor, mas ainda existem.
Pois bem, escolhida a sessão das 22 horas, podemos passar a outro problema: ter que sair de casa pelo menos às 20 horas. Sim, duas horas antes. Como não mais existem cinemas que não estão dentro de shoppings, temos sempre que contar com o congestionamento para se chegar ao shopping, afinal não existe shopping em Brasília que não tenha congestionamento para chegar. Após o congestionamento para chegar ao shopping, temos a fila do estacionamento, a fila para comprar ingressos, a fila para entrar na sala de cinema, isso sem mencionar a fila para comprar pipoca a qual eu geralmente deixo de lado, afinal já estou de saco cheio de enfrentar filas.
Depois disso, finalmente podemos sentar para ver o filme. Vamos ignorar completamente o chão sujo e grudento do cinema e o fato de que cada passo é difícil, afinal os pés sempre ficam grudados na sujeira do chão.
Passemos direto pra parte boa, de sentar e ver o filme. Lembro de uma época que só existiam trailers antes do filme, agora é propaganda de bancos e sei lá mais o que. Sério, são quase meia hora de propaganda antes do filme começar de verdade.
Após ver o filme, o qual vamos supor aqui que foi tranqüilo e não teve nenhum imbecil gritando dentro da sala do cinema, vamos a mais filas: para sair da sala de cinema, para pagar o estacionamento, para sair do shopping...
São dezenas de filas para um simples ato de ver um filme. Chegamos ao ponto de que ver um filme no cinema se tornou uma atividade estressante. Precisamos passar por todo esse ritual apenas para vermos um simples filminho.
Sinceramente, depois de tudo isso, ainda tem gente que vem reclamar de pirataria. Um filme pirata me afasta desse ritual moderno e bizarro. Mas eu admito, se resolvessem os problemas acima descritos eu pagaria até o dobro pra ver um filme.