Era mais um dia de audiências na justiça do trabalho. Como é absolutamente normal, as audiências estavam atrasadas e isso gerava uma certo mal estar na sala de espera, afinal de contas, constantemente a parte Autora da ação ficava obrigada a ficar no mesmo ambiente que a parte ré, e quando havia uma certa inimizade oriunda da relação de trabalho o clima sempre ficava meio tenso. Pareciam que os segundos se arrastavam e o relógio quase ia para trás, mas o tempo sempre passa, mesmo devagar, e pelo alto-falante as partes foram chamadas para a audiência, era hora da conciliação.
Era um caso de assédio moral no trabalho. O autor da ação, chamado na justiça do trabalho de Reclamante, era um senhor com cerca de 40 anos tinha uma expressão cansada e amargurada no rosto, parecia muito magro, como se não dormisse bem há muito tempo, tinha os olhos fundos e uma pele ressecada. Ele entrou na sala de audiência seguido por seu advogado. Logo após, entrou na sala de audiência o representante do réu e seu advogado.
Normalmente, as empresas grandes como aquela que era ré no processo, mandam representantes para as audiências da justiça do trabalho. Naquele caso era diferente. Quem acompanhava o advogado era um homem de óculos grossos cujos cabelos começavam a rarear, era magro mas não cadavérico, e meio pálido como se não visse muito a luz do sol, trajava um excelente terno que parecia ser feito sob medida. Ele com certeza não era apenas um “preposto”, ali estava presente o dono da empresa ré. E cabe esclarecer aqui que na justiça do trabalho o réu era chamado de Reclamado.
As partes se sentaram e foi iniciada uma tentativa de acordo. Mas havia uma tensão no ar, o dono da empresa estava com um leve sorriso no rosto e olhava diretamente nos olhos do autor do processo. Isso era uma provocação, velada, mas incisiva, que somente aqueles dois entendiam. O juiz, sentado em sua cadeira, lia algumas páginas do processo para melhor se inteirar do que acontecia e por fim perguntou:
- Há alguma possibilidade de acordo?
O dono da empresa, se antecipando ao advogado, simplesmente disse que não havia a menor possibilidade de acordo, e mantinha aquele sorriso provocador nos lábios. Nessa hora, o Reclamante não agüentou e explodiu:
- EU TE ODEIO! Você acaba com a minha vida e mesmo assim chega aqui sem nenhuma proposta de acordo? Você é um tremendo canalha.
Não adiantou o juiz pedir calma para aquele homem, ele parecia estar claramente transtornado. O reclamante tremia com uma raiva que estava contida já tinha muito tempo, estava quase chorando em meio a uma sala de audiência lotada de jovens estudantes de direito. Com um certo custo, o juiz, que se mantinha calmo mas firme, juntamente com o advogado do Reclamante, conseguiram fazer com que este se acalmasse.
Nessa hora, o dono da empresa, pediu a palavra. O juiz relutou, mas o Reclamado disse que era importante e que poderiam resolver o processo ali mesmo, no que o juiz assentiu. Então ele disse:
- Sim excelência, não tem acordo nesse processo unicamente porque eu irei pagar exatamente a quantia que ele pediu na petição inicial.
E assim pegou um talão de cheque e começou a preenchê-lo, sob os olhares perplexos de todas na sala de audiência. Cabe aqui lembrar que era uma quantia alta, e aquele homem preenchia o cheque como se aqueles valores não lhe fizessem a menor diferença.
O juiz nunca havia visto uma cena como aquela, e se viu obrigado a perguntar, movido por uma curiosidade incontrolável, o que havia feito aquele homem acatar o pedido do Reclamante sem nem mesmo tentar reduzir o valor a ser pago. Nisso, o Reclamado, com calma e uma certa elegância orgulhosa respondeu:
- Excelência, eu sempre fui considerado um nerd, um fracassado, looser, cdf, e qualquer outros desses adjetivos que são muito comuns em colégios de ensino médio. Sempre fui alvo de gozações, brincadeiras de mal gosto, o tal do bullying que se fala hoje em dia. O Reclamante com certeza não se lembra de mim, mas eu com certeza me lembro dele pois, durante todo o meu ensino médio a pessoa que mais me humilhou foi ele. Por várias vezes tive vontade de chorar, de matá-lo, de me matar ou de nunca mais voltar ao colégio de novo. Mesmo depois de ter saído do colégio, o rosto dele e as humilhações me perseguiam. Demorei anos para voltar a ter confiança em mim mesmo de novo. Mas o tempo passou, me formei, abri minha empresa que atualmente está passando ao largo de toda essa crise econômica mundial. A uns anos atrás, qual não foi a minha surpresa quando o currículo desse homem chegou na minha mesa. Eu me lembrava dele, de seu rosto, das humilhações... Ele com certeza não era qualificado, mas eu resolvi contratá-lo unicamente para devolver tudo o que ele fez comigo. E nos últimos 5 anos fiz questão de fazer isso, transformei a vida dele num inferno. Sempre tratei bem meus funcionários, ele era o único que não. Era humilhado, cobrado, exposto, ridicularizado em tudo que fazia, exatamente como ele fez comigo a vários anos atrás. Se para devolver tudo que sofri tenho que pagar essa quantia, o faço com muito prazer, pois valeu cada centavo.
A perplexidade era geral. Ninguém na sala era capaz de dizer coisa alguma. O juiz, muito sério, mandou seu assistente redigir a ata, mas resolveu tentar moralizar a conduta do Reclamado:
- Sr. Creio que essa não foi a melhor forma de resolver o problema. Sua atitude foi horrível em guardar rancor por tantos anos de algo que era feito por meras crianças.
Nisso, o Reclamante retrucou, mas de forma educada:
- Ora excelência, e se o sr. pudesse humilhar todas as pessoas que já te fizeram algum mal na vida? O senhor faria isso? Eu apenas agarrei a oportunidade que a vida me deu. Acho que a maioria das pessoas faria o mesmo que eu.
A ata da audiência havia ficado pronta. Todos se mantinham ainda num silêncio perplexo. O Reclamado se levantou, assinou a ata de audiência, entregou o cheque ao Reclamante, e ainda com o seu elegante sorriso disse a ele:
- Tenha uma boa vida.
E assim o Reclamado saiu da sala de audiência, com um doce sabor de vingança dentro de si e um sorriso incontido nos lábios.
Marina Braga says:
31 de março de 2012 às 05:13
Baseado em fatos reais?!
Seria o tipo de filme que eu gostaria de ver!
Marina Braga says:
31 de março de 2012 às 05:13
Baseado em fatos reais?!
Seria o tipo de filme que eu gostaria de ver!
Cobaia says:
19 de abril de 2012 às 13:26
Eu pegaria - com todas as minhas garras...
Cobaia says:
19 de abril de 2012 às 13:26
Eu pegaria - com todas as minhas garras...
Aline Duarte says:
29 de maio de 2016 às 19:10
Aline Duarte says:
29 de maio de 2016 às 19:10
Aline Duarte
29 de maio de 2016 às 19:14
A vingança nunca é plena, mata a alma e envenena...
Ou não, né?
Aline Duarte
29 de maio de 2016 às 19:14
A vingança nunca é plena, mata a alma e envenena...
Ou não, né?